“O sistema de ensino nunca mais será o mesmo”

Presidente do Conselho de Administração da Florida Christian University reflete sobre as rápidas mudanças que vêm se desenvolvendo no universo educacional

O presidente do Conselho de Administração da Florida Christian University (FCU), professor Dr. Anthony B. Portigliatti, trilhou uma trajetória pouco usual no universo acadêmico. Nascido na cidade de Santa Fé, Argentina, com família de origem italiana, mudou-se para o Brasil e viveu durante 28 anos no país, lapidando aqui algumas de suas maiores paixões, como a educação, o empreendedorismo, o desenvolvimento humano e, a maior de todas elas, sua família. Em 1999, transferiu-se com ela para os Estados Unidos para assumir a presidência da FCU e desenvolver outros projetos empresariais.

Sob sua liderança, a Florida Christian University transformou-se em uma instituição de alcance global de ensino superior para estudantes que procuram integrar seus estudos com a fundamentação e a ética cristãs. Com vasta experiência nos meios acadêmico e empresarial, o
Prof. Dr. Portigliatti afirma que depois da pandemia da
Covid-19 nada mais será como antes no sistema educacional e o que antes levaria anos para acontecer foi antecipado em poucos meses. “A pandemia nos atentou para a necessidade de adaptarmos o nosso modelo educacional, para que possamos responder aos anseios do mundo contemporâneo”, reflete.

Nesta entrevista, o Prof. Dr. Portigliatti reflete sobre o papel da educação diante deste “novo normal” e ressalta a importância da inteligência emocional e do autoconhecimento na busca pelo desenvolvimento do potencial de cada um. Ele, aliás, é presidente do Soar Global Institute, responsável por desenvolver uma metodologia que ajuda na compreensão de si e do outro, sugerindo caminhos e estratégias para minimizar ou potencializar características intrínsecas a cada pessoa. Acompanhe a seguir:
Como o senhor vê o papel da Educação diante das transformações que o planeta atravessa e dos inúmeros desafios que estão postos para a sociedade atual?

Quando refletimos sobre o contexto e desafios globais atuais, vamos nos deparar com uma crescente necessidade de avanços nos mais diversos aspectos acadêmicos, desde a ciência à filosofia. As dificuldades ocasionadas pela COVID-19, bem como as transformações de uma sociedade mais globalizada, impulsionam o âmbito acadêmico a fortificar seus alicerces e modernizar métodos de ensino, a fim de garantir uma maior acessibilidade.

A conjuntura do mundo moderno nos põe diante de um mercado cada vez mais competitivo e exigente. Para correspondermos esta necessidade e buscar avanços nos índices econômicos, precisamos tomar medidas que visem capacitar o mercado profissional. A educação precisa seguir a tendência de evolução e se tornar mais acessível, sem perder seu conteúdo.

Precisamos nos atentar a realidade cada vez mais imediatista do mercado de trabalho e das relações interpessoais. Hoje, tudo virou para ontem, as respostas e demandas precisam ser dadas imediatamente. Diante desta postura, a educação também precisa se modernizar, se colocar ao lado desta tendência e exigência mundial. Vejo, por conseguinte, a necessidade de evoluirmos e adaptarmos ao ‘timing’ exigido pelo mundo atual.
A pandemia da Covid-19 está acarretando mudanças profundas nas relações humanas e em toda a dinâmica de funcionamento da sociedade, do mundo do trabalho e também, é claro, da educação. Como o senhor enxerga essa conjuntura? Seremos melhores e mais eficientes depois de tudo isso?

Sim. A pandemia nos atentou para a necessidade de adaptarmos o nosso modelo educacional, para que possamos responder aos anseios do mundo contemporâneo. Instituições que antes jamais pensariam em dar aulas online se viram forçadas a se adaptar a esta realidade em tempo recorde e adaptar o seu método de ensino para conseguir atender as expectativas de seus estudantes.

Estamos diante de um novo real e, enquanto sociedade, vamos precisar adaptar a forma como nos relacionamos, a forma como trabalhamos. Quem diria que veríamos uma sessão do Supremo Tribunal Federal online? Ninguém nunca imaginou que chegaríamos neste ponto. Antes, não pensávamos em entrevistas, reuniões e negociações acontecendo via plataformas de comunicação digital, hoje já se tornou normal e, na maioria das vezes, a principal forma pela qual elas acontecem.

Acredito que, mesmo depois desta pandemia acabar, essa realidade a qual nos adaptamos ficará, porque elas foram, em sua maioria, um grande avanço na forma que nós, enquanto sociedade, funcionamos. Este sim é o novo normal.
Como gestor há 21 anos da Florida Christian University, que comparação o senhor faz do ensino superior norte-americano ao brasileiro? O que poderíamos agregar ao nosso sistema que faz a diferença nos Estados Unidos?

O sistema básico de ensino tem duas grandes influências. O anglo saxão que adota o sistema andragógico e o sistema latino-europeu que tem como preferência o método pedagógico. O Brasil, como país altamente influenciado nos mais diversos aspectos pelo sistema europeu, adotou a forma pedagógica, em que o ensino é feito de uma forma vertical, o mestre ensina o aprendiz. Em que pese as conquistas deste método de educação, a realidade americana do método andragógico e socrático, em que há uma troca de experiências e de aprendizado, me parece mais adequada ao desenvolvimento educacional, participativo e empreendedor.

O método de ensino que utilizamos precisa sempre passar por vasta reflexão. Não defendo o abandono completo do sistema pedagógico, principalmente no ensino primário, mas acredito que precisamos observar outras perspectivas e adotar, no que couber, institutos e técnicas intrínsecas ao sistema americano que tem características mais prático-assertivas e uma maior liberdade.

A perspectiva do sistema de ensino precisa ter dois objetivos claros: o primeiro é a transmissão, qual seja, a capacidade de transmitir para as novas gerações aquilo que a ciência já sabe. Destarte, o pressuposto não é que os cientistas descubram novamente o antibiótico, mas que eles já partam deste conhecimento. Não queremos gastar tempo e energia refazendo coisas que a ciência já encontrou a resposta.

Não obstante, a educação precisa ser estimulada, este é o segundo objetivo. Nesta esteira, ao mesmo tempo em que transmitimos o conhecimento, estimulamos os estudantes para que eles adquiram raciocínio e pensamento crítico/filosófico e possam questionar. O grande objetivo do estímulo educacional é a inovação, é a ciência, é não deixar o estudante se acomodar com o que já sabe e provocá-lo, a fim de que produza novidades, assim como produzimos o carro, a luz elétrica, o telefone móvel, a internet.
O senhor acredita que a formação tradicional ainda seja o caminho ideal para os jovens alcançarem o êxito profissional? As instituições de ensino estão preparadas para fazer frente a esta realidade menos previsível que vivemos hoje?

O sistema tradicional de educação vem passando por reformas há décadas. Veja, por exemplo, a história da FCU: quando chegamos, em 1999, nossos cursos eram 94% presenciais e 6% à distância, tínhamos como premissa a forma de ensino tradicional, em que o aluno precisa estar frente a frente com o professor para que possa, de fato, aprender o conteúdo.

Com o passar dos anos, fomos implantando o conceito de ‘brick'(ou tijolo) e ‘click’ (clique), ou seja, precisávamos garantir conteúdo, um prédio moderno que atendesse as nossas expectativas, tivesse uma boa localização e um bom espaço com mais de 126 salas (‘brick’), mas ao mesmo tempo acessibilidade e estrutura digital (‘click’). Por conseguinte, nos tornamos o oposto do que éramos, hoje somos 90% online e 10% presencial. De modo que até mesmo quando a pandemia atingiu o mundo, nós já estávamos preparados, já sabíamos como lidar, porque esta é a tendência natural do mundo! O ensino online e acessível é, cada vez mais, a realidade do sistema educacional.

Recordo-me que, até o ano passado, várias instituições acreditavam que o método tradicional nunca ia mudar, ia sobreviver por várias gerações como método principal de educação, existia, até mesmo, um preconceito contra o ensino à distância. Hoje, esta não é mais a realidade, as coisas mudaram. A verdade é que o sistema de ensino nunca mais será o mesmo. As mesmas instituições e universidades que não gostavam da ideia de aula online, se adaptaram em tempo recorde e começaram a oferecer todos os seus cursos e aulas online, à distância, mesmo com professores que, apesar de tremendamente preparados, ainda não estavam familiarizados com essa tamanha comunicação digital.

Além disso, ainda existe a realidade de adaptação com relação ao mercado de trabalho. Não tem como exigirmos 5 anos para uma graduação em um curso de bacharelado. O mercado quer tudo pra ontem e precisamos ainda nos adaptar a esta realidade, precisamos entender que tudo mudou, o marketing sofreu uma modernização e se tornou o neuro-marketing, o que era apenas engenharia se modernizou e agora é inteligência artificial, robótica, tudo mudou e a educação precisa acompanhar esta evolução.

O senhor tem uma vasta trajetória acadêmica e empresarial. Conte um pouco sobre sua formação e os caminhos que trilhou para chegar tão longe.

As necessidades e desafios que passamos na vida, ou mesmo as fraturas emocionais que nos atingem, podem gerar algumas reações: uma reação negativa, ou vitimista, em que a pessoa transfere a responsabilidade de tudo o que acontece para terceiros e vive uma eterna negação de maturidade emocional e profissional; a neutra em que a pessoa perde reação a praticamente todas as coisas e vive a vida sem expressar seus reais desejos ou emoções. E tem, ainda, a terceira que é a pessoa que usa a fratura emocional como trampolim para provar para si mesma e para os outros que é capaz e que consegue atingir e vencer grandes desafios.

Minha vida pode ser facilmente enquadrada no terceiro tipo. Tenho origem italiana, nascido na Argentina e mudei para o Brasil ainda muito jovem. Lá conheci grandes paixões, a do desenvolvimento humano, a da educação, a do empreendedorismo e a minha esposa que me levou a formar a grande paixão da minha vida que é minha família. Sempre fui altamente ligado à área de desenvolvimento humano e educação, com grande interesse de trazer novas perspectivas à realidade educacional e emocional da sociedade.

Quando vim para os Estados Unidos, aprendi a juntar todas as minhas paixões de maneira orgânica e saudável, assumi a presidência da Florida Christian University, uma universidade com fundamentos sólidos, com história e prestígio, fundei o Excellence Senior Living uma instituição de cuidados e assistência a idosos e ainda o Soar Global Institute que tem como premissa o estudo de perfis de personalidade e desenvolvimento na área de inteligência emocional, a fim de trabalhar a educação e o desenvolvimento humano e também trazer a minha paixão empreendedora para impulsionar estas três instituições.

Hoje, sou realizado, pois tenho minha família envolvida em tudo isso, junto comigo na busca do aperfeiçoamento educacional, no desenvolvimento substancial humano e como minha eterna rocha de sustentação e apoio.

Atualmente a inteligência emocional ou a ausência dela é um componente decisivo para o sucesso ou insucesso das pessoas no âmbito profissional e acadêmico. Como desenvolver o potencial da nossa mente e do nosso comportamento da maneira mais satisfatória possível? Quais caminhos o senhor apontaria?

O impacto da inteligência emocional sempre existiu e sempre foi uma necessidade e realidade nas mais diversas relações, profissionais, sentimentais e, até mesmo, educacionais. Hoje, felizmente, começamos a dar a devida atenção para este aspecto do ser humano e conseguimos ter mais incentivos e importância em pesquisas e estudos que têm como fim a exploração da inteligência emocional.

Hoje, tenho muito orgulho de ser o presidente do Soar Global Institute que pesquisa perfis de personalidade comportamentais focado no desenvolvimento de inteligência emocional. Sempre alerto todos os participantes e público dos lugares em que dou palestra para a necessidade de nos conhecermos e refletirmos sobre quais atitudes podemos tomar e como elas refletem no nosso dia a dia.

Os caminhos que aponto para desenvolvermos o potencial da nossa mente é o autoconhecimento, precisamos nos entender e nos conhecer. De forma que saibamos nos adaptar aos diferentes contextos e relações, sem perder nossas virtudes e também nosso próprio eu. Acho que, mais do que nunca, precisamos parar de simplesmente sermos reativos e começar a entender como nós funcionamos e o porquê de funcionarmos de determinada forma.

O principal caminho para atingirmos sucesso profissional e acadêmico é a autorreflexão e o autoconhecimento como armas poderosas no nosso próprio desenvolvimento emocional e nos adaptarmos às diferentes relações interpessoais, usando todo nosso potencial sem abrirmos mão da nossa saúde emocional.

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